segunda-feira, 5 de março de 2018

Hospital São Francisco: Parto (des)humanizado

Ilustração da médica plantonista
Por Shirley Marciano

Mãe de primeira viagem, no alto de sua aventura progenitora -- o parto. São 22h30, estou em casa saindo do banho. A bolsa estoura e, assim, seguimos para o hospital São Francisco de Jacareí. Pelo meu convênio, poderia fazer o parto em três hospitais, neste, no Antoninho da Rocha Marmo ou na Santa Casa. Optei pelo São Francisco porque minha obstetra disse que lá era mais orientado a quem desejasse o parto natural, e era o meu caso. Até visitei antes o hospital para ter certeza de que seria o melhor para mim. Na ocasião, perguntei se dariam a injeção peridural para reduzir a dor do parto, e a enfermeira disse que sim. 

As contrações começaram no carro, mas ainda eram leves. Estava com o maridão Edmon, que esteve comigo do começo ao fim, segurou minha mão, me confortou e deu força. Então, entrei em uma sala e me deixaram sentada numa cadeira por cerca de duas horas, somente na companhia do meu marido. Nessa hora já haviam me dado um avental, o qual eu permaneceria com ele até o parto, toda encharcada. Num dado momento, entrou uma enfermeira que falou: "se quiser, pode deitar em uma das camas da enfermaria". Foi um alívio porque as dores estavam aumentando. 

Não sei bem ao certo, mas creio que fiquei ali por mais umas quatro horas. Quando chegaram para me dizer que eu teria que ir para o quarto-- local onde aconteceria o parto --,a enfermeira pediu para eu sair da cama. Era daquelas camas altas de hospital, sabe. Eu não conseguia descer porque estava sentindo dor. Ela, ao invés de me ajudar, disse algo do tipo: "vamos! Com essa moleza você não vai conseguir parir um filho". Por fim, consegui descer com a ajuda do meu marido, mas sentindo muita dor. Depois entendi porque eu não estava conseguindo me movimentar. Minha bexiga estava cheia e pressionando. Mas não é o tipo da coisa que você entende de imediato. Só percebi quando fui ao banheiro e senti o alívio na mobilidade.

Já no quarto definitivo, a médica plantonista, que não recordo o nome, mas lembra um personagem de desenho, veio fazer o exame de toque. Ela e a enfermeira -- cavalas é elogio para essas duas -- fizeram o exame de toque à força. Uma me segurou  e a outra  brutalmente fez o serviço. Foi uma dor horrível. Meu marido esboçou indignação (ficou puto mesmo) com a situação, e então a médica falou: "é assim mesmo, pai". O exame de toque é necessário para saber quanto está de dilatação, mas a maneira foi absurda. Outras enfermeiras, depois, fizeram umas três vezes essa aferição, mas nem de longe foi da forma como essa médica procedeu.

Por questões óbvias, fiquei a madrugada e a manhã inteiras acordada e sem comer nada. Mesmo implorando para que  dessem algum remédio para amenizar a dor,  principalmente a injeção peridural, não quiseram oferecer um analgésico sequer. O objetivo era me colocar na linda estatística de parto humanizado do Hospital São Francisco, sem terem me consultado, é claro. Só quando eu já estava quase lá,  com oito de dilatação (o parto acontece com 10), me colocaram no soro para acelerar o processo. Isto depois de 13 horas de sofrimento. Quando entrou o soro, em  minutos comecei a sentir uma dor insuportável. 

Fui ao banheiro porque sentia que precisava, mas foi uma confusão da minha cabeça, porque, na verdade, era um sinal de que o bebê estava vindo. Nessa hora, o Edmon saiu por um instante para chamar a enfermeira e brigou com todo mundo que encontrou pela frente (ele é muito bravo!), pelo descaso e por me deixarem ali sem assistência. Depois que ele "causou" no hospital, veio um monte de gente me atender. Entrou uma tropa no quarto. A enfermeira me tirou do banheiro e conferiu a minha dilatação. Já estava com 10. Ou seja, por minutos eu poderia ter tido meu filho dentro da privada. 

Na hora do parto, eu estava fora de mim por causa da dor. Lembro que as enfermeiras pediam para eu não gritar, mas fazer a força direito. Eu não sabia o que elas queriam que eu fizesse, mas estava tentando. Acabei sendo submetida a uma episiotomia sem  qualquer pedido de autorização. Quando meu bebê finalmente nasceu foi uma calmaria. Toda a dor passou. Elas jogaram o meu menininho cheio de sangue em cima da minha barriga e pediram para o Edmon cortar o umbigo. Devo dizer que isso para mim foi um pouco chocante. Provavelmente, na modalidade 'parto humanizado' isso faz parte do show...

São paulino desde criancinha
(foto de ontem, 04/03)
Após o parto, pediram para eu descer da cama, sentar numa cadeira e já amamentar. Na sequência, pediram para eu levantar para trocar um absorvente, junto da enfermeira. Eram 15h do dia 12 de setembro, e eu sem dormir e comer desde às 20h do dia anterior. No momento que entro no banheiro, sinto que minha pressão caía rápido. Acordei com a enfermeira esfregando água no meu rosto. Como sempre, no estilo punitivo, ela disse: "não vai querer dormir no banheiro, não é?!

Esse foi o  parto do São Francisco, o qual o hospital se orgulha de dizer que é 'referência'. Eu nunca quis o parto humanizado, mas tão somente o normal, porque a recuperação é mais rápida. O que fizeram foi ilegal, desumano e absurdo. Para mim, além da violência obstétrica, houve negligência.

Deixo claro que não tenho nada contra o parto humanizado, mas a mulher tem que estar de acordo com esse procedimento. E há formas e formas de se fazer. Nota zero para o hospital na parte de obstetrícia. 

O lado bom de ter sido parto normal foi a minha recuperação. Saí do hospital e já fui até fazer compras no mercado. O bebê nasceu saudável e está a coisa mais linda do mundo. O meu Igor, meu amorzinho, já tem 5 meses.